004. Bresson e seus precursores
Informações sobre o curso – A visão modernista da história da arte – Narrativa lacunar e o cineasta como compositor – Animais, mimetismo, violência – Documento e performance – Uma encruzilhada
Anunciei há alguns dias um curso online sobre a poética de Robert Bresson. As inscrições devem ser feitas neste formulário.
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O curso vai se concentrar nos filmes de Bresson, e por isso evitar o diálogo com outros cineastas. Abordar esses diálogos renderia um outro curso, por exigir uma ampliação do campo histórico e incluir a questão das influências.
Uma das abordagens mais interessantes dessa questão é a que Jorge Luis Borges tornou famosa no ensaio “Kafka e seus precursores” (1951). Borges já havia comentado em outro texto como a leitura de um conto de Nathaniel Hawthorne “prefigura Kafka, mas este modifica e afina a leitura de ‘Wakefield’. A dívida é mútua: um grande escritor cria os seus precursores”. No ensaio dedicado a Kafka, Borges cita exemplos de épocas e culturas diversas: um paradoxo da filosofia clássica, um fragmento chinês do século IX, parábolas de Kierkegaard, um poema de Robert Browning, contos de Léon Bloy e Dunsany. Ele resume da seguinte maneira:
Se não me engano, as peças heterogêneas que enumerei se parecem com Kafka; se não me engano, nem todas se parecem entre si. Este último fato é o mais significativo. Em cada um desses textos reside a idiossincrasia de Kafka, em grau maior ou menor, mas se Kafka não tivesse escrito, não a perceberíamos; ou seja, ela não existiria.1
A ideia é simples, mas foi a geração de Borges que deu a ela uma forma clara e aparentemente inquestionável. Em 1919, T.S. Eliot defendia uma leitura semelhante da tradição, que ele pensava como uma “ordem de monumentos”:
A ordem existente é completa antes da chegada da obra; para que a ordem persista após a absorção da novidade, toda a ordem existente deve, ainda que minimamente, ser alterada; e assim as relações, as proporções, os valores de cada obra de arte em relação ao todo são reajustados; e isto é a conformidade entre o velho e o novo.2
É um argumento que talvez tenha se enraizado a tal ponto que não percebemos o quanto é característico do modernismo. A história da arte passou a ser vista como tendo uma dinâmica própria, não-linear. Uma vez que surge uma obra marcante, original, influente, o conjunto é modificado em todas as direções, como se uma pedra tivesse perturbado a superfície de um lago e lançado ondas que chegam a diferentes margens.
É o caso de Bresson. Uma vez que seus filmes são vistos, é difícil, talvez impossível, não ver o que há de bressoniano em outros filmes. Certos efeitos, temas, operações, hoje nos parecem suas descobertas. Reconhecemos com alguma facilidade os que vieram depois e que exibem sua influência. Outros podem ter sido influenciados de forma indireta ou inconsciente. Mas o desafio maior, e o mais interessante, é notar, como fez Borges, aqueles precursores que, por caminhos inesperados, mostram algo que reconhecemos como bressoniano – que prefiguram, sem saber, aquela parte do cinema que agora chamamos de Robert Bresson.

